E a ela não cabia odiar, sabia que ao leve sussurro daquela voz era capaz de esquecer tudo aquilo que a feria, sabia disso. Ambos sabiam.
Ambos sabiam e por isso continuaram a falar e a escutar, um por não querer ser odiado, o outro por não querer mais odiar. Falaram por horas, tocando em pontos tão delicados e ainda assim prosseguindo fortes e harmônicos. Eram alfinetadas suaves, preocupações doces, interesses disfarçados. Ali nada os tocaria. Eles não se tocariam.
Ela quase ouvia o que aquela voz pensava e dessa forma se aquecia, não se arriscava porem a perguntar nem a deixar a ideia germinar; apesar de tudo sabia o quanto sofrera e, vez em quando, ainda sofria.
A intervalos se perguntava o por quê de continuar ali, falando, ouvindo. Nenhuma vez se respondeu.
Ela estava mais forte agora, a voz sabia disso. Tinha provado da indiferença, da ausência e da mudança dela. Não insistia pois agora reconhecia o peso do não.
Seguiam respeitosos e gentis, agradáveis e nostálgicos, todavia sabiam que ao silêncio de ambos, ao desligar dos telefones, toda aquela bolha criada sabe-se-lá-de-onde desapareceria e a realidade do passado voltaria acertando em cheio seus pontos mais vulneráveis. Sabiam disso.
Se arrastaram o quanto puderam, o mais longe permitido, mas já era tarde (ou cedo demais) as orelhas ardiam e o dia já vinha apressado, sabiam. E sabiam que logo mais seria diferente, que ao silêncio tudo voltaria ao normal, a ser igual. Ambos sabiam e ambos disseram adeus.